Investigação da Polícia Federal aponta que pessoas ligadas à cúpula do governo do Acre estavam alocados no gabinete extinto do ex-deputado estadual Eduardo Farias (PCdoB), com mandato encerrado em janeiro de 2015. Relatório da PF aponta existência de funcionários fantasmas na Assembleia Legislativa
Em novo relatório emitido pela Polícia Federal na última semana, indícios apontaram que alguns dos alvos da Operação Ptolomeu, que investiga um suposto esquema de corrupção na cúpula do governo do Acre, estão usufruindo de um ‘gabinete-fantasma’ na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) desde janeiro de 2024. Nesta terça-feira (28), a casa legislativa fez uma entrevista coletiva para falar sobre o caso.
O documento, obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo, foi elaborado pelo policial federal Lucas Santos da Silva, e mostra que os investigadores identificaram pelo menos seis pessoas, ligadas ao governo do estado, que recebiam salários de até R$ 23 mil reais. O gabinete o qual eles estavam alocados seria o do ex-deputado estadual Eduardo Farias, que deixou a Aleac em 2015. O g1 também teve acesso ao documento.
Este parecer, produzido por meio de provas colhidas durante as fases anteriores da Operação Ptolomeu, foi enviado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) na última sexta-feira (24) e aponta ainda que houve ‘realocação’ de alvos em outras funções públicas, tendo em vista que o parecer dado pela ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, inclui a restrição de ocupação de cargos públicos.
Dentre os listados pelo relatório da PF, estão:
Rosângela da Gama Pereira Pequeno, ex-chefe de gabinete que foi presa na 1ª fase da Ptolomeu
Anderson Abreu de Lima, tio do governador Gladson Cameli e ex-secretário de estado;
Carlos Augusto da Silva Negreiros, coronel da PM-AC
Glayton Pinheiro Rego, engenheiro civil
João Lima de Souza, servidor comissionado
Jerffson Luiz Pereira
Arlindo Garcia de Souza
O g1 não conseguiu entrar em contato com as defesas dos citados até a publicação desta reportagem.
Mesa diretora da Assembleia Legislativa do Acre alega erro de sistema
Carlos Alexandre/Secom-AC
Em entrevista coletiva nesta terça-feira (28), o procurador de Justiça de Estado, Marcos Mota, disse que todos os dados estão corretos e que a falha consistiu ao migrar tais informações para a vista de sistema do tribunal. Ainda de acordo com ele, não houve ‘má-fé’.
“Houve uma falha entre a comunicação dos dois sistemas. As informações saíam corretas do sistema da Aleac e eram recepcionadas de maneira equivocada no sistema do Tribunal de Contas no Sistema de Controle de Aplicação [Sicap], devido a uma tabela com códigos de especificação de unidade de lotação que não era compatível com a tabela de códigos de unidade de lotação aqui da Aleac. Se se deveu ao fato de que, no ano de 2021, a Aleac trocou seu sistema de gestão de pessoas e lá no Sicap, permaneceu a tabela do sistema anterior”, disse.
Ex-deputado Eduardo Farias manifestou supresa ao ver seu nome envolvido em susposto esquema
Reprodução/Rede Amazônica Acre
O ex-deputado Eduardo Farias se manifestou, nesta terça, pelas redes sociais a respeito do caso envolvendo seu nome. Ele disse que recebeu a informação ‘com surpresa’ e que vai informar à PF que não tem envolvimento com o caso. Em nota, falou ainda que encerrou o mandato em 31 de janeiro de 2015.
“Solicitarei ainda, na forma da lei, esclarecimentos à Mesa Diretora da Aleac sobre os referidos fatos e acionarei a Justiça para que sejam dadas as devidas providências legais quanto ao uso indevido de meu nome, o que incorre, no mínimo, em danos morais”, disse.
Na foto, 18 dos 34 investigados na terceira fase da Operação Ptolomeu, no Acre
Reprodução
Investigados
A ex-chefe de gabinete do governo do Acre, Rosângela Gama, já foi presa em dezembro de 2021 pela Polícia Federal, e agora atua como assessora técnica de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-AC) com salário de mais de R$ 11 mil. A portaria foi assinada pelo presidente do TCE-AC, José Ribamar Trindade de Oliveira, no dia 27 de janeiro de 2023. O relatório mostra que ela passou a integrar o gabinete-fantasma em agosto a dezembro de 2023, seis meses após ser solta.
Anderson Abreu de Lima é tio do governador Gladson Cameli e ficou por três anos no comando da Secretaria de Estado de Indústria, Ciência e Tecnologia do Acre (Seict). Na época da exoneração, que saiu no Diário Oficial do Estado (DOE), dizia que foi ‘a pedido’ do gestor. O relatório da PF aponta que ele passou a receber, a partir de março deste ano, o montante de R$ 23 mil no gabinete de Eduardo Farias.
Carlos Augusto da Silva Negreiros era o chefe da Casa Militar do Acre, foi afastado durante a 3ª fase da Ptolomeu e foi exonerado em junho do ano passado. Apontado na presente investigação como um agente que, supostamente, atuou de forma direta em diversas operações de lavagem de dinheiro, a PF diz que ele passou a integrar como servidor da Aleac em janeiro de 2024, recebendo mais de R$ 8 mil líquidos.
Glayton Pinheiro Rego era fiscal de obras e atuava como servidor Departamento de Estradas de Rodagens do Acre (Deracre). Ele também supostamente estaria lotado no gabinete do Eduardo Farias, recebendo mais de R$ 7 mil.
Jerffson Luiz Pereira, dado pela PF como ‘importante operador de Gladson Cameli’, é apontado também como a pessoa que realizava depósitos suspeitos nas contas de Cameli e da ex-primeira dama Ana Paula.
João Lima de Souza é apontado pela PF como ‘transportador de valores’. Ele, assim como Jerffson, também foi lotado na Aleac desde janeiro deste ano recebendo mais de R$ 7,4 mil.
Arlindo Garcia de Souza também teve como destino o gabinete de Eduardo Farias este ano. O relatório da PF aponta que ele foi servidor-fantasma da Aleac de julho de 2021 a setembro de 2022, ‘com um aparente desvio dos salários recebidos em favor de Ana Paula, na época primeira-dama do estado do Acre”.
Gladson Cameli se tornou réu por unanimidade no STJ
Jornal Nacional/Reprodução
Governador réu
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu, no dia 15 de maio, por unanimidade, a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) e tornou réu o governador do Acre, Gladson Cameli, por envolvimento num suposto esquema de desvio de recursos públicos. Os ministros, entretanto, negaram o afastamento de Cameli do cargo. Com isso, ele permanecerá à frente do governo do Acre enquanto responde à ação.
A corte também determinou a indisponibilidade de bens do governador e a manutenção de medidas cautelares que já haviam sido adotadas contra ele – que não foram detalhadas no julgamento.
Na denúncia apresentada à Justiça em novembro passado, a PGR acusa Cameli pelos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção passiva, peculato e fraude a licitação. Segundo a procuradoria, Cameli comandou um esquema de fraudes em licitações para obras públicas no Acre que levou a um prejuízo estimado em pelo menos R$ 150 milhões.
STJ torna governador do Acre réu em ação que apura fraude em licitações
Operação Ptolomeu
A operação Ptolomeu investigou supostos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro por membros ligados ao governo do Acre. A Polícia Federal, com apoio da Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou, no dia 16 de dezembro de 2021, a primeira fase da operação, quando foram cumpridos 41 mandados de busca e apreensão e um mandado de prisão no Acre, Amazonas e Distrito Federal.
Já na 2ª fase, deflagrada ainda em 2021, a PF disse que foi detectado que servidores públicos estavam obstruindo a investigação. Um vídeo, que a Rede Amazônica teve acesso com exclusividade, mostrava as investigadas ocultando celulares durante a deflagração da 1ª fase da ação.
A terceira fase ocorreu no dia 9 de março com o cumprimento de 89 mandados de busca e apreensão em seis estados e no Distrito Federal.
VÍDEOS: g1