Francis Nunes trabalhou sua vida inteira com cultura regional no Acre. Mestra montou peças sobre a marujada, que conta a história dos marinheiros, e pastoril, que contam histórias da Bíblia. No último mês, fraturou o fêmur após uma queda e está impossibilitada de andar. Mestra do Acre recebeu a estrela do Acre, pela contribuição na cultura do Estado; ela pede ajuda para custear tratamento após queda que fraturou o fêmur
Arquivo pessoal
Envolvida com a cultura no Acre por quase toda a vida, Francisca Inas Mouzinho, conhecida com Francis Nunes, atualmente com 81 anos, pede ajuda para custear tratamento em decorrência de uma queda que fraturou o fêmur. Em razão disto, a mestra não pode mais andar.
Seu amor pelo teatro começou quando ela tinha apenas 5 anos de idade e junto com suas primas, fazia parte do pastoril de sua avó cantando ‘Glória a Deus e aos anjos’. Natural de Mâncio Lima, a mestra, cantora e compositora recebeu o g1 em sua casa e contou que o pastoril era feito de maneira independente pela avó, em um povoado chamado Guarani, onde ela ensinava as netas.
O pastoril são espetáculos de dança, teatro e música que é originado em Portugal e retrata o nascimento de Jesus. No Brasil, chegou com os colonizadores, que através do teatro ensinado pelos jesuítas, catequizavam os povos indígenas.
Assim, ela acabou se encantando com o teatro e mesmo casando muito cedo, aos 15 anos, Francis fazia teatro com os alunos de sua escola. Depois da morte da avó, manteve a tradição e liderando as primas, continuou com as apresentações do pastoril, dando aulas de catecismo na igreja, onde também introduziu as peças. “O pessoal me perguntava muito como que eu tão novinha, tinha uma cabeça tão boa, com aquela imaginação. Nesse tempo eu já fazia as músicas”, diz.
Primeiras peças de Francis foram o pastoril
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Após dois anos de casada, ela se separou e decidiu seguir para Cruzeiro do Sul , onde conheceu mais a fundo a marujada, e decidiu que faria parte dessa festa. Ela que era costureira, fazia as roupas e acessórios para ela e os participantes do folguedo [dança dramática], sem cobrar nada.
“A gente queria mesmo era mostrar o trabalho. As crianças participavam, naquele tempo não tinha televisão, não tinha celular, essas coisas da tecnologia, aí as crianças ficavam muito alegres de ir pra marujada. Foram crescendo e quando eu parava de fazer diziam: ‘tia não deixe não o teatro, que a gente gosta muito’. Lá a gente conseguia o Centro Operário [local] e ensaiávamos e quando chegava o dia tinha uma grande apresentação, com cortina e tudo”, explica.
A mestra diz que era uma festa linda que lotava os locais por onde ia. Francis nessa época, ia acompanhada de sua irmã e primas, porém eram as únicas mulheres participantes da marujada. Os outros componentes do grupo eram do sexo masculino.
A marujada é uma dança folclórica comum nas regiões norte e nordeste do Brasil. É considerada uma importante representação cultural, onde participam homens (geralmente com os instrumentos musicais), mulheres (geralmente nas danças e encenações) e também crianças (nas encenações) em representações da vida dos marinheiros em alto mar.
Com dança, música e reza grupo apresenta marujada em Rio Branco
Francis Nunes decidiu vir para a capital trabalhar com cultura, que era o seu sonho
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Trajetória
Em Cruzeiro do Sul, Francis retomou o casamento, teve quatro filhas, sendo que duas morreram. Quando tinha por volta dos 30 anos, quis trabalhar com cultura na capital do Acre, mas o marido não a apoiou. Foi assim que ela decidiu ir sozinha para Rio Branco e não pôde levar as filhas que já tinham 7 anos, já que o marido não deixou. “Ele não quis me acompanhar, então decidi vir só. Era o que eu queria fazer, eu queria trabalhar com cultura. Ele tinha uns problemas com bebida também por isso deixei ele lá”, afirma.
Ao chegar na capital, a mestra conseguiu um emprego no governo para trabalhar na área administrativa da educação. Depois de muito tempo, ela voltou a trabalhar com o teatro. Após 10 anos em Rio Branco, Francis casou novamente e teve três filhos.
Francis focou em compor e cantar
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Após 25 anos de funcionalismo público, se aposentou e decidiu focar na carreira cultural: com música, teatro e canto. “Sempre gostei de cantar, desde criança. O pastoril era todo cantado, a marujada também”, comenta.
Nesse interim, conseguiu o feito de gravar oito álbuns, com todas as músicas de sua autoria, e que tocavam nas rádios de Rio Branco, na década de 1990. Um deles é o “Mistérios da Natureza”, que está catalogado e disponível nas plataformas de áudio.
Com isso, a mulher ganhou diversos prêmios ligados a cultura. Fez parte do grupo Baque Mirim e até hoje colabora com o grupo Grupo Gafas [Grupo de Apresentação Folclórica do Acre].
Ainda hoje, Francis colabora com o grupo Gafas
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Trabalho voluntário
Antes de completar 40 anos de idade, Francis começou a fazer trabalho voluntário em instituições de caridade, trabalho este que ela desenvolveria por 45 anos, após um voto que fez a Deus. Além das apresentações, ela arrecadava doações em sua própria casa para levar aos necessitados. Também levava alimentos e fazia as apresentações em locais como: Educandário Santa Margarida, Lar dos Vicentinos e hospital do Idoso.
Por trabalhar tantos anos com a cultura local, Francis teve seu trabalho reconhecido pelo Estado do Acre, e com isso, foi considerada mestra de cultura por sua trajetória na música e no teatro regional. Ela ganhou a estrela do Acre por seus feitos, conhecimentos e realizações.
Por 45 anos, Francis também desenvolveu trabalho voluntário em Rio Branco
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Saúde
Gerliano Nunes, filho de Francis, conta que com o passar do tempo, ela já vinha tendo a mobilidade reduzida. Ela já venceu um câncer, o que pode ter fragilizado sua saúde óssea por conta da quimioterapia. Um machucado no braço e uma queda que ela levou anteriormente também diminuíram ainda mais a locomoção da idosa.
Agora, com 81 anos, quebrou o fêmur e está em recuperação pós cirúrgica. Ela realizou o procedimento há pouco menos de 1 mês e por esse motivo ainda está acamada. A família agora busca ajuda para ajudar com os custos de medicamentos, fisioterapia e cuidados. “Infelizmente é um tratamento muito custoso que a família precisa arcar. Por isso estamos pedindo ajuda”, declara.
Mestra Francis Nunes pede ajuda para custear tratamento após fraturar fêmur
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